Vila Meã, uma terra com história...

Padre RODRIGO DA CUNHA

Rodrigo da Cunha

O Padre Rodrigo da Cunha nasceu em Vila Meã (Real) no dia 13 de Junho de 1917. Faleceu na freguesia de Santa Marinha, concelho de Vila Nova de Gaia, no dia 12 de Junho de 2008).

 

 

Retirado de:

https://www.amarante.pt/freguesias/real/index.php?op=conteudo&lang=pt&id=49

De todos os filhos de Real que optaram pela ordenação sacerdotal o Padre Rodrigo foi aquele que mais fez para deixar o seu nome mais tempo à vista.

Formado na Escola Franciscana, curou uma freguesia próxima do centro de Paredes, onde acumulava a sua acção espiritual com a direcção do Externato de Paredes, colégio particular onde “fizeram o quinto ano” muitos alunos desta freguesia de Real, usando a facilidade que o comboio representava para a sua deslocação à procura do ensino.

Quando deixou estas funções, passou a curar a freguesia de Santa Marinha em Vila Nova de Gaia.

Aí passou a desenvolver a sua veia poética e desta atitude apareceram quatro livros de poemas: A última mensagem, Na noite, A madrugada, Mas... as estrelas continuam e Para além das estrelas o amor.

E como o Padre Rodrigo “ainda mexe” na poesia, não se ficarão por aqui as suas publicações.

 

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Padre Rodrigo da Cunha  (Por Alexandrino Brochado)

Ficamos mais pobres, é costume dizer-se nestas conjunturas. Tirando a debilidade do lugar comum da frase, com toda a verdade podemos afirmar: com a morte do Padre Rodrigo da Cunha todos ficamos mais pobres, sobretudo sob o aspecto religioso, cultural e artístico.


O P. Rodrigo da Cunha era uma presença de grande dimensão poética. Fez da sua cultura literária púlpito do seu sacerdócio. Sempre me deliciei a saborear os lindos versos do P. Rodrigo da Cunha, pela beleza, o equilíbrio e moderação no tratamento dos assuntos mais delicados e difíceis. Dava gosto ler os seus sonetos.


Ele sabia aproveitar o que há de divino nas situações humanas. Sabia aproveitá-lo como ninguém. As coisas mais pequenas e insignificantes da vida forneciam-lhe sempre pábulo abundante para considerações primorosas que as pessoas cultas ou menos cultas sabiam compreender e interpretar. O estilo e a linha de pensamento do P. Rodrigo da Cunha era sempre este: levar à descoberta de Deus e da Sua bondade, a um encontro quase natural com a beleza da vida e seus valores. Ela teve sempre, como pano de fundo, o projecto do sorriso, da compreensão, da alegria, do amor e do perdão.


Sem querer invadir o pensamento de Eça de Queiroz, eu diria que, com a morte do P. Rodrigo da Cunha "um rouxinol deixou de cantar". Com este amor das coisas nobres e belas da vida, certamente se identificava a alma do P. Rodrigo da Cunha, sacerdote artista, a quem podemos aplicar estas palavras cheias de pudor viril, de George Bernanos: "quando eu morrer, dizei ao doce reino da terra, que eu o amei mais do que fui capaz de dizer".


O P. Rodrigo da Cunha, no reino dos sonetos, é um senhor. Cultivou o soneto como ninguém. Sempre o soneto aparece como uma forma poética de grande prestígio e de primeira importância. Esta importância manteve-se ainda durante o período do neo-clássico setecentista e só veio a declinar com o romantismo. Todavia, após o eclipse romântico, o soneto readquiriu, com o parnasianismo e o simbolismo, uma nova irradiação e uma nova força. Ainda hoje o soneto nos aparece como uma forma poética muito bela e algo difícil. Não faz sonetos quem quer. Escreve sonetos quem tem garra de poeta, como na pintura só faz retrato quem tem garra de pintor.


O Padre Rodrigo da Cunha foi exímio ao escrever sonetos que lemos com verdadeiro prazer espiritual. Alguns sonetos atingem um nível notável de perfeição no pensamento e na forma. Por felicidade pude penetrar no âmago da sua poesia, nomeadamente os sonetos. É que, o Padre Rodrigo da Cunha, procurando descobrir em mim um valor crítico que eu não tinha, sempre que publicava um livro, dirigia-se a mim a solicitar "duas palavras sobre a sua obra". Assim me habituei a ler com muita atenção e a apreciar sobremaneira a obra poética do P. Rodrigo da Cunha.


Qualquer palavra laudatória sobre a obra poética de Rodrigo da Cunha poderá ser classificada por alguns, como um chorrilho de piropos. Mas não é. É a expressão da verdade. Alguns sonetos de Rodrigo da Cunha ultrapassam em beleza os de Florbela Espanca.


Até breve, P. Rodrigo da Cunha. Junto de Deus será o nosso grande encontro, na posse dos valores infinitos, pelos quais sempre lutámos na vida.

 

TRÊS SONETOS:

Na Terra, onde moro por engano

 

Pertence aos nossos pés rasar o chão,

como todas as outras criaturas,

mas delas nos distingue a condição

de viver a sonhar com as alturas.

 

Estrelas que morais lá na distância,

mas que de nós ao fim estais tão perto,

mostrai por que caminhos desta ânsia

algum dia eu me possa ver liberto.

 

Hora a hora me prendem novos laços,

que no tempo me fixam os espaços,

com que a vida de vós me distancia.

 

E na Terra, onde moro por engano,

com a sombra das coisas me profano,

na luz pensando em vão, dia após dia.

 

 

OS BRASÕES DE REAL

 

Teu nome Real, fala de brasões...

Dos que outrora nos ligam a Mancelos.

E dos que ali ao lado, em Castelões,

falam dos velhos castros e castelos.

 

Só que o tempo não pára. Sempre avança.

Não nos quis ver a força do progresso.

Ao que antigamente era uma esperança,

a vida quis pagar humilde preço.

 

Mas deixou-nos a imagem do passado.

É a honradez quem marca o nosso fado.

Dele herdamos a única riqueza.

 

Mesmo que à nossa porta bata a fome,

jamais a trocaremos pelo bom nome.

Sempre ele será o pão da nossa mesa.

 

 

Vila Meã a António Nobre

 

Buscando um outro ar, outro ambiente,

chegaste à nossa terra, nesse dia.

Encontraste, ao teu lado, toda a gente,

no calor do carinho e da alegria.

 

Bem quiséramos dar-te sangue novo,

com tudo o que a palavra quer dizer.

Quantas vezes por ti chorava o povo,

ao ouvir: – Coitadinho, vai morrer…

 

Mas ele, que te vira no São Brás

alternar o bulício com a paz,

fazendo a despedida à mocidade,

 

não deixou que jamais fosses embora.

Tão vivo, como então estás agora,

na dimensão da nossa saudade.

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